Às dezasseis horas, doze minutos e dezoito segundos do dia vinte e um de maio ele virou a cabeça contra a sala e olhou para lá da janela. Três segundos antes houvera um beija-flor que saltara do seu plátano no jardim e enquanto os dois segundos que levou a atingir o degrau não tinham passado, passou uma massa de vento de intensidade média a cento e vinte e três pés de altura e soprou do fundo de si para uma nuvem que deslizou sobre o ar e num tempo imperceptível houve ainda um raio que passou entre os flocos de água e resplandeceu nas penas verdes da asa do beija-flor sem que ele desse por isso, tornando-o tão belo e dourado que nem ele saberia alguma vez que o tinha sido.
Só depois o beija-flor, descendo levemente, atingiu o cimento com o mínimo som e, da janela, ele olhou-o como um espectador endoidecido mas calado. O beija-flor desceu um ou dois degraus, e entre descer mais outros dois ou três, parava à beira de cada patamar, e redescobria de todas as vezes, como que se quisesse confirmar, que se encontrava realmente no centro de onde estava. Olhou-o muito confundido com o que se passava, e entre seu vórtice interior, houve qualquer sinapse (certamente um neurónio muito génio durante a época em que viveu) que lhe ofereceu o desejo de ser tal como o beija-flor, saltando de degrau em degrau e redescobrindo-se a todo o momento sem ter a noção de que o fazia - pelo menos era isso que tinha sonhado. Descendo mais três ou quatro, o beija-flor saiu, e desapareceu atrás duma parede branca sem que ele mesmo tivesse notado. Tempo de voltar.