02 junho, 2012

Mudo


E depois olhou à sua volta e viu que o universo estava a chorar compulsivamente, e que estava sozinho para afagar o seu pranto, o universo inteiro, e que os abismos estavam prestes a implodir o seu desgosto para cima dos mundos todos, porque já não o suportavam mais, e as estrelas, as estrelas minguavam sob o crepúsculo dos céus, e encolhiam durante os séculos para que a sua luz não fosse neles reflectida e eles não fossem portanto iluminados, e desviavam-na para o infinito, para os mundos que já desconheciam. E no fundo das convulsões épicas, os homens restavam, assim como os vermes, rendidos à melancolia do universo, depondo os seus sonhos como se as túnicas dos seus corpos sobre a superfície plana da morte que é para eles o próprio infinito.
Viu nesta desgraça tal beleza que ficou obcecado pela sua sensualidade e sentiu medo de si próprio por isso. E depois tremeu de assombro. E ficou, ficou definitivamente, e a vida nele tinha de tal modo congelado que já não estava a transitar no tempo sequer, e agora era apenas uma forma.
E depois um silêncio devastador, um silêncio nuclear, um silêncio ainda mais árido do que a extensão dos desertos, capaz de os engolir, que desconcertava a própria vida, e que era a resposta a todas as orações que foram consagradas desde o princípio.
Um silêncio que acompanhou eternamente a existências das coisas, e que não dizia se já cá tinha estado antes da vida ou depois dela.
Restava-lhes ouvir no silêncio o próprio manifesto que ele declara quando soa.

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